quarta-feira, 21 de fevereiro de 2007

A hora do acidente

Nove e meia da manhã, quarta, 25 de outubro. Aperto o botão do elevador rumo à garagem. Ponho o capacete e sorrio ao ligar a harley, como sempre. O dia está ensolarado e eu tenho uma reunião com Samuel S. em meia hora, nos jardins. Pego a marginal e o vento me diz que esse vai ser um bom dia. Ponte cidade jardim, túnel, av europa.

Sigo pela avenida vazia, na faixa da direita, e quando estou a poucos metros da rua portugal um imbecil na faixa central resolve virar subitamente nessa mesma rua Portugal à direita, bloqueando toda a minha via.

A em velocidade de cruzeiro, a Sportster precisa de alguns poucos metros para brecar. Mais metros do que eu tinha a disposição, estes ainda atravessei derrapando. Durante um tempo quase eterno diversos pensamentos me atravessaram, por extenso, como “Caralho dessa vez eu me fudi!” e “olha só, meu primeiro acidente de moto”.

Uma porta azul se aproxima, pneus escorregam e cantam como numa ópera, interrompida por um barulho horroroso que sou eu e a moto batendo contra o carro; soube na hora que algo de muito errado tinha acontecido com meu pé. Então um vôo sabe-se lá por onde dura um tempo indeterminado e acaba, longe do local do acidente, com um magnífico estabaco contra o asfalto.

Dói na hora. Quem diz não dói deve ter ficado inconsciente. Dói pra burro e piora a cada momento. Peço pra alguém pelo amor de deus chamar o socorro. Me sinto sufocado pelo capacete. Tiro o óculos escuros, o capacete, ponho os óculos de novo, fotófobo que sou e tento me mexer. Uma multidão me adverte pra ficar parado.

Peço para uma mulher ali na rodinha para ligar para o meu escritório e contar o que aconteceu. A imbecil liga lá e diz a seguinte frase “olha to ligando para avisar que o motoqueiro da empresa sofreu um acidente” e desliga o telefone. Parece que eu tenho que fazer tudo eu mesmo.


Alguém põe minha moto de pé e diz que ela parece quase ok, me confortando. E tenta me entregar o pedal da marcha, que educadamente recuso. Claro que a moto parecia ok. Aparentemente eu protegi ela com algo macio, o meu corpo.

Começo a verificar o estrago: sangue nos braços e nas mãos . Mexo o dedinho da mão, que dói pouco, e concluo que não deve estar quebrado, mas estava quebrado em dois lugares. Minha coxa está molhada mas também não sinto dor ali. Acho que todos os canais de dor estavam ocupados com meu tornozelo. Reparo que além de um motoboy tirando foto de mim com o celular, uma verdadeira multidão olha horrorizada pro meu pé.

Resolvo olhar também e vejo que ele, o pé, estava em uma posição absolutamente antinatural, de lado, com uma fratura que parecia exposta mas era apenas quase. Quando eu conectei a dor com a visão do estrago começou a doer bem mais, ignorance is bliss. Eu peço de novo pra chamarem o resgate, alguém diz que já chamou. Catzo, chamasse outro! Tive vontade de levantar e dar porrada. E de chorar. Mas não fiz uma coisa nem outra e pelos próximos vinte minutos nem sinal de resgate. Sem dúvida os minutos mais longos da minha vida.

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